PARTE 1
OUVIR E ENTENDER MÚSICA
PRELIMINARES
por Coelho De Moraes baseado na obra de Aaron Copland
Não adianta apenas ler sobre música, por isso, por esses textos irão sugestões de audição. Há necessidade absoluta de ouvir. Rádio, Vitrola, CDs, DVDs, Música pelo Satélite, FMs, MP3, MP4, MP ad infinitum, download de musica online, o sujeito que cantarola na esquina, ora, direis, ouvir cordéis, o RAP – que não é mais do que o repente do Nordestino, o barulho urbano, o barulho rural, enfim. Serão fontes seguras de que um tipo de cultura se manifesta. Nem sempre boa. Cultura é uma coisa. Cultura rica é bem outra.
É necessário assumir que HipHop é produto da corte e não da colônia. É cultura importada. Platão já dizia: - Quer subordinar um povo? Mude a sua cultura. Interfira na sua cultura. Especialmente a música.
Há que se ouvir, mas há que se ter cuidado. Tem gente que diz: “Gosto muito de música mas não entendo muito bem”. Da mesma forma que dizem não entender nada de teatro ou de literatura. É claro que nos referimos aqui à obra não industrial. Toda música será comercial à medida que se possa vendê-la. Muitas músicas serão, além de tudo, produzidas em escala industrial, com fórmulas que se repetem para não haver erro no escoamento do produto. Tem que vender e sucesso acaba por se, erroneamente, coisa de quem vende muito. Não é.
Sucesso é coisa subjetiva e de objetivo aqui temos a produção musical, a criação, a busca de outra linguagem.
Não é dessa música que falamos. Falamos daquela, então, em que há preocupação com o novo, com a criação do novo, a criação de uma outra expressão, se não na idade da obra pelo menos no conhecimento que se faz dela.
Primeiro: Não se deve ser pessimista em relação à sua capacidade musical. Há muito erro conceitual espalhado por aí. Sempre ouvimos histórias de pessoas que “são tão musicais que vão ao cinema e quando voltam para casa tocam a música do filme ao piano”. Podemos dizer que um animador de auditório que imita um ator não é necessariamente o ator imitado e muito menos um ator. É só um imitador. Quem faz mímica musical não é necessariamente um músico. E nem tem um musicalização profunda. Para ser um músico real tem que ter fundamento e conhecimento adquirido.
Outro atributo muito valorizado é o do ouvido absoluto. Eu o chamo de ouvido obsoleto. O fato de se decorar um lá (convencionado) não significa coisa alguma. Há culturas (povos) cuja afinação não se dá por LAS 440 nem por coisa alguma. Na idade média, renascimento, quando as alturas e texturas e extensões eram diferentes de país para país e nem todos os instrumentos se afinavam por igual, esse ouvido seria considerado como?
O ouvido absoluto é uma musicalidade de superfície. Útil dentro de limites.
Segundo: A pessoa deve ser capaz de reconhecer uma melodia, uma estrutura, uma seqüência de harmonias, pois do contrário estará se aproximando da surdez absoluta, aí sim, um perigo.
E não adianta clamar por São Beethoven que era um surdo diferente pois ele ouvia onde deveria ouvir, no seu íntimo de pensador musical.
Agora, se você, caríssimo leitor, ouve uma determinada melodia, ou estrutura temática, ou harmonia e, pode reconhecê-la, então estamos no caminho certo.
E, não é preciso entendê-la, mas apenas reconhecê-la e curtir o lance.
Senti-la, talvez. O sentir é a capacidade de usufruir da estética. E isso é bom.
Terceiro: A Música é uma arte que se desenrola no tempo. Como um romance. A diferença é que em geral o romance fala de coisas da vida, imediatamente captáveis, concretos, objetivos, enquanto que a música tem valores abstratos e seus signos terão valores diferentes para cada pessoa. Dependerá do conteúdo de cada pessoa.
A melodia – em modos gerais – ocupará na música a função que a história ou tema ocupa no romance, mas nem sempre. A melodia estaria mais para um discurso direto. A história pode ser contada de outras maneira, como por exemplo, por uma sucessão de acordes.
A melodia – via de regra – é o significado final da peça, mas todo cuidado é pouco. Muitas vezes o significado vem da estrutura. Outras vezes vem da forma, da organicidade, do caminho das harmonias, dependendo da época de que estamos falando ou ouvindo.
Quarto: Reconhecer – a grosso modo - a melodia, significa que você sabe onde está, em termos musicais. Tem muita chance de não se perder no caminho, apesar de não observar a paisagem.
Daí saberá para onde está indo sem perceber as belezas do caminho. Mas, começaremos por ai. E isso é bom.
Sugestão: Comecemos pelo Villa. Sugiro de imediato os Estudos para Violão. Jóia perene.
PARTE DOIS
OUVIR E ENTENDER MÚSICA
COMO VOCÊ OUVE?
por Coelho De Moraes baseado na obra de Aaron Copland
Ouvimos música em três planos: a) plano sensível; b) plano expressivo; c) plano puramente musical. Mesmo que a gente não saiba disso. Nem de tudo sabemos mesmo. Somos seres finitos.
Mas, vamos lá, dentro desses humanos limites.
a) Plano Sensível: Devemos nos entregar inteiramente ao prazer de ouvir o som. Nada mais. Sem intelectualismos. Sem sacadas geniais. Sem críticas. Ouvir sem pensar. Tomar um banho de som, por assim dizer. Escolha um CD que nunca ouviu – exemplo MISHIMA, do Philip Glass - Ligue seu aparelho e deite-se no tapete da sala e feche os olhos. A percepção do som alterando seu estado mental. E, deixe rolar. Uma nota percutida ao piano, quem sabe, no silêncio da sala já altera a atmosfera da sala e, quem sabe? Altera o seu estado mental. Buscar estados alterados de consciência com o uso e abuso da música ou do som. Um acorde ao violão e o mundo já mudou. Parafraseando algumas religiões: “O elemento sonoro tem poder”.
É necessário dizer que o elemento sonoro varia de compositor para compositor. Basta ver (ouvir) a diferença entre Ravel e Beethoven. Varia com o estilo. Notando estas diferenças você será um ouvinte consciente.
b) Plano Expressivo: Stravinsky dizia que sua música era um “objeto”, uma “coisa”, dotada de vida própria e sem significado a não ser o musical. Diferente do que dissemos no capítulo 1, ela nem precisa contar história alguma. No entanto a música traz em si a expressão e, uma vez construída por seres humanos, - até prova em contrário, - expressão de algo. Diferente para cada pessoa que ouve. Ou que produz a música. Depende do conteúdo cultural e educacional e existencial de cada ouvinte ou cada compositor. A música tem um significado? – SIM. É possível precisar qual significado é esse? - NÃO.
Mas, as pessoas sempre acham que tudo deve ter um significado bem concreto, bem palpável. Portanto tire da cabeça de relacionar a música com alguma coisa material ou específica. Não será esse o caminho. Há mais mistérios entre o céu e a terra... e o resto você sabe, caro Horácio. Mas, em linha geral, a música que, sempre que ouvida, dizer a mesma coisa, será mais pobre do que aquela em que, a cada audição, ouvirmos uma novidade que estava escondida ou não foi percebida imediatamente. A música que em todos os aparelhos de som não muda em nada e paupérrima em relação àquela música que em aparelho de diferentes ressalta alguma coisa nova ou críptica. A primeira é a música industrial, comercial e descartável. A segunda, essa última, provavelmente, durará mais tempo no ouvido coletivo da humanidade. Essa última se tornará um clássico de repertório. O autor dessa música será consagrado.
Tente explicar as variações para cravo de Bach. Excetuando os adjetivos simplificados de “temas alegres ou tristes”, tente uma explicação dos temas do Cravo Bem Temperado. Você verá, também, que duas pessoas diferentes terão sugestões diferentes para a mesma música.
c) Plano Puramente Musical: O plano das notas e sua manipulação. Tocar nessas notas algo que possa determinar para o ouvinte o Timbre, a Altura, a Harmonia, o Colorido Tonal, o Ritmo, a Melodia, a procura da época em que a peça foi feita, seu contexto histórico. Falaremos disso em textos que virão. Paciência! Esse assunto é amplo e fala do âmago da música.
Devemos lembrar que essa divisão em partes é apenas para estudo. Não se ouve nada separadamente. É um complexo sonoro tendo tudo ao mesmo tempo em ação.
De certa maneira o ouvinte ideal está dentro e fora da música ao mesmo tempo. Uma atitude subjetiva-objetiva está implícita na criação e na apreciação da música.
Experimente - já hoje, pois não há tempo a perder, – ouvir Mozart e Duke Ellington, na ordem que bem entender. São dois mestres de dois estilos diferentes. Vejamos: A Lacrymosa do Réquiem e Caravan.
Agora você é alguém, consciente, que está ouvindo alguma coisa. E sabe do que se trata.
Ficou ciente, também que deverá se munir de material sonoro.
Veja menos novela. Ouça mais música. O tempo de duração é o mesmo. A qualidade das obras nem se compara. Treine a audição. Pode começar com obras solo, – só piano, só violão – buscar duetos (piano voz, violão clarineta, harpa e percussão), para daí seguir a complicações mais evidentes.